Se esconder de um Dominante do Caminho da Espada n?o era apenas desafiador, era quase impossível. Seus sentidos eram incomparáveis aos de um humano comum, sendo dez vezes mais agu?ados. Ouvir o menor dos sons ou perceber o menor dos movimentos estava bem dentro de suas capacidades. Enganar sua audi??o e vis?o era uma tarefa que exigia mais do que habilidade—exigia um plano meticuloso.
Felizmente, Lucien já havia pensado nesse detalhe crucial. Ele n?o era um guerreiro, muito menos um mestre, mas possuía algo que os superava em momentos críticos: astúcia e inteligência. Os dois guardas que ele havia encontrado no corredor momentos atrás eram de rank guerreiro, uma amea?a considerável, mas n?o intransponível. Se fossem mestres, a situa??o seria muito mais complicada—mas n?o impossível.
O verdadeiro trunfo de Lucien era o caos lá fora. O tumulto causado pelas feras mágicas capturava toda a aten??o dos guardas, desviando seus sentidos super-humanos para o campo de batalha. Era o momento perfeito para Lucien passar despercebido, e ele n?o desperdi?ou essa oportunidade.
Cada passo que ele havia dado era um triunfo silencioso sobre o perigo. Ele n?o podia falhar. Falhar n?o era uma op??o.
Um Peso Maior que o Ouro
De frente a porta do escritório, Lucien sentia o peso do motivo que o empurrava para frente. Este trabalho n?o era apenas perigoso; era insano. Ele estava infiltrado na mans?o de um Grande Mestre, cercado por guerreiros e armadilhas mágicas, tudo para alcan?ar um cofre cheio de riquezas que poderia mudar sua vida para sempre.
Mas o que realmente o movia n?o era o ouro. Era Lucy.
A imagem de sua irm? mais nova era tudo o que ele precisava para ignorar o medo que rastejava em sua mente. Lucien sabia que, se falhasse naquela noite, Lucy estaria fadada a uma vida miserável. Sem ninguém para protegê-la, ela seria empurrada para o mesmo caminho de desespero que muitos jovens abandonados eram for?ados a trilhar—servi?os sujos, trabalhos humilhantes, ou pior.
"Eu n?o posso falhar."
Ele murmurou as palavras para si mesmo, como um mantra. Seus olhos percorreram o corredor, atentos a qualquer sinal de perigo. A adrenalina queimava em suas veias, mas sua determina??o era maior.
Lucien sabia que sua única chance era ser perfeito. N?o havia espa?o para erros, n?o havia segunda tentativa. Cada movimento, cada respira??o precisava ser calculada.
Ele ajustou a postura ao ouvir um som distante—vozes. Outros guardas provavelmente se dirigiam para refor?ar a batalha no lado de fora.
Seu cora??o martelava no peito, mas ele n?o permitiu que o medo o consumisse. Tudo o que ele fazia naquela noite tinha um propósito claro. Cada risco que corria, cada decis?o que tomava era por Lucy.
A verdade era simples: Lucien n?o roubava por ganancia. Ele n?o era um ladr?o comum. Tudo o que fazia, toda sua luta, era para garantir que Lucy tivesse uma vida melhor.
"Eu volto para você, Lucy. Prometo."
Com isso em mente, ele apertou os punhos, determinado a superar todos os desafios que surgissem. Afinal, era por ela que ele arriscava tudo, e por ela que ele precisava voltar vivo.
Sem hesitar mais um segundo, Lucien ergueu o frasco à altura da ma?aneta e pressionou-o levemente. Um som quase inaudível de algo derretendo preencheu o silêncio do corredor, e, em quest?o de segundos, as runas gravadas na madeira desapareceram, deixando a porta com uma aparência completamente comum, desprovida de sua antiga imponência mágica.
Ele soltou um suspiro de alívio, mas n?o relaxou. Seu cora??o parecia contar histórias de horas de tens?o, quando, na verdade, apenas seis minutos haviam se passado desde o início de sua invas?o. Em seis minutos, ele havia atravessado barreiras que ninguém ousava sequer pensar em desafiar. Havia enganado homens armados, superado armadilhas ocultas, e agora estava diante de algo que o fazia hesitar.
A porta rangeu ao ser empurrada, revelando um espa?o que fez Lucien piscar em confus?o. O que viu n?o era nada do que esperava.
O ambiente era um escritório, mas n?o qualquer escritório. Era um lugar que parecia ter sido arrancado de outra era, como se o tempo tivesse parado dentro daquela sala. A mobília era robusta, feita de madeira maci?a com entalhes ornamentados que contavam histórias de épocas antigas. Uma escrivaninha grande dominava o centro do c?modo, polida até brilhar, mas com marcas de uso que revelavam sua idade.
Ao lado dela, estantes de livros iam do ch?o ao teto, abarrotadas com volumes de capa dura em tons de vermelho, preto e marrom, cada um exalando o cheiro de couro envelhecido e tinta desbotada. Um candelabro pendia do teto, com velas que ainda queimavam suavemente, projetando sombras vacilantes nas paredes.
Havia uma poltrona de couro, surrada pelo tempo, com marcas que sugeriam incontáveis noites de leitura ou reflex?o. Uma lareira apagada, mas impecavelmente limpa, completava o cenário. Acima dela, pendia um quadro emoldurado, retratando uma paisagem montanhosa envolta em névoa, t?o realista que quase parecia se mover sob o jogo de luz e sombra das velas.
Apesar de todo o esplendor antigo, o escritório emanava uma sensa??o de vazio e mistério. Algo ali estava errado. N?o era apenas o fato de Elias, um grande mestre, ter um lugar t?o modestamente decorado. Era a atmosfera sufocante, como se o ambiente carregasse segredos que n?o queriam ser descobertos.
Lucien fechou a porta atrás de si com cuidado e deu mais alguns passos para dentro. Seus olhos percorreram cada canto, buscando algo que pudesse indicar onde o cofre estava escondido. Ele sabia que Elias n?o deixaria algo t?o precioso à vista, mas a simplicidade desconcertante do local o fazia duvidar de seus próprios instintos.
Foi ent?o que ele notou o espelho.
Era grande, ocupando quase toda a parede oposta à escrivaninha. Sua moldura era intrincada, dourada, com detalhes que lembravam gravuras de criaturas míticas: drag?es entrela?ados, serpentes mordendo suas próprias caudas, e corvos com olhos de pedras brilhantes. A superfície do espelho era impecável, refletindo a sala com uma clareza quase surreal.
Lucien ficou parado, encarando sua própria imagem por um momento. Mas algo no reflexo fez sua respira??o vacilar. Ele franziu o cenho, inclinando a cabe?a ligeiramente. N?o era ele que parecia fora de lugar. Era o espelho.
Na sua superfície, as chamas das velas tremeluziam de maneira estranha, como se algo além delas estivesse se movendo na sala.
Stolen content warning: this tale belongs on Royal Road. Report any occurrences elsewhere.
Lucien deu um passo à frente, seus olhos estreitando enquanto ele examinava o reflexo mais de perto. O que ele estava vendo? Ou, pior ainda... o que ele n?o estava vendo?
Lucien n?o sabia nada sobre magia rúnica, mas sabia o suficiente para respeitá-la. Era um campo de estudo complexo e intimidador, reservado apenas aos intelectos mais agu?ados ou às mentes mais obstinadas. Runas n?o eram apenas tra?os desenhados à m?o; eram portais para o impossível, manifesta??es de poder bruto que podiam moldar a realidade. E Elias era um mestre nessa arte. Anos de dedica??o haviam lhe concedido o domínio sobre uma for?a que poucos ousavam sequer tentar compreender.
E agora, Lucien estava no cora??o do território de Elias, enfrentando exatamente esse poder. Cada porta, cada canto daquela mans?o parecia carregado de uma energia sutil, uma sensa??o de que ele estava sendo observado por algo invisível, algo que podia atacar a qualquer deslize.
O mais estranho de tudo, no entanto, era o artefato que Lucien carregava. O pequeno frasco, frio em sua m?o, pulsava levemente com uma energia própria. Ele n?o fazia ideia de como o homem sem nome havia conseguido algo t?o poderoso, muito menos por que tinha confiado nele t?o facilmente. N?o houve perguntas, nem exigências de lealdade. Apenas um olhar calculista e uma entrega sem hesita??o.
“Por que ele me deu isso?” A pergunta ecoava em sua mente enquanto ele se movia rapidamente pelo escritório. N?o havia tempo para dúvidas. Lá fora, o caos era ensurdecedor. Gritos de dor e rugidos de bestas se misturavam, criando uma sinfonia grotesca que fazia os nervos de Lucien latejarem. Ele sabia que era apenas quest?o de tempo antes que a guarda real fosse acionada. Talvez, porém, os próprios guardas da mans?o conseguissem conter as feras.
Ou talvez n?o.
Lucien precisava se apressar. Cada segundo desperdi?ado era uma senten?a de morte.
Ele come?ou a vasculhar o escritório com a precis?o e a rapidez de um ladr?o experiente. Primeiro, a escrivaninha. Ele abriu cada gaveta, seus olhos percorrendo papéis, livros e objetos com rapidez. Muitos eram irrelevantes, anota??es pessoais ou documentos administrativos que n?o tinham utilidade. Uma das gavetas estava trancada, mas ele a arrombou com uma lamina fina que sempre carregava. Nada.
Ele passou para as estantes de livros. Seu olhar treinado buscava qualquer padr?o incomum: livros fora de lugar, lacunas na fileira de volumes, qualquer coisa que sugerisse um mecanismo escondido. Ele puxou um livro de capa escura, esperando que uma passagem secreta se revelasse, mas o único som foi o das páginas se abrindo inutilmente.
"Maldi??o," sussurrou, a frustra??o come?ando a tomar conta.
Ele foi até a lareira. Correu os dedos pelas bordas do quadro que pendia acima dela, procurando algum mecanismo oculto, mas tudo parecia sólido e imutável. Até mesmo o tapete debaixo de seus pés foi levantado às pressas, revelando nada além de um assoalho impecável.
O tempo parecia escapar por entre seus dedos. Seus movimentos ficaram mais frenéticos, mas sua mente permanecia fria. Ele precisava encontrar o cofre. Ele sabia que estava ali em algum lugar. Elias n?o deixaria algo t?o importante em outro lugar.
Foi ent?o que seus olhos recaíram sobre o espelho novamente.
Grande, imponente, e ainda assim, de alguma forma, discreto. Era a única coisa naquela sala que parecia destoar de todo o resto. Enquanto tudo exalava funcionalidade e simplicidade, o espelho era ornamentado, quase exagerado em sua opulência.
Ele caminhou até ele, devagar, a sensa??o de tens?o crescendo em seu peito. Seu próprio reflexo parecia observá-lo de volta, uma vers?o de si mesmo que parecia mais cansada, mais tensa. A moldura dourada era trabalhada com detalhes impressionantes, mostrando criaturas mitológicas em um entrelace quase hipnótico.
Lucien estendeu a m?o e tocou a superfície do espelho. Frio, como ele esperava. Mas algo no toque parecia errado, como se houvesse uma resistência sutil, algo que n?o deveria estar ali.
Ele pressionou o artefato contra o canto da moldura. Uma vibra??o percorreu o espelho, e por um momento, ele pensou ter ouvido um sussurro, como um eco vindo de muito longe.
E ent?o, ele viu.
No reflexo, onde deveria haver apenas a parede atrás de si, apareceu algo mais. Um baú, incrustado diretamente na parede. Lucien girou o corpo rapidamente, mas quando olhou diretamente para o local, n?o havia nada lá. Apenas o reflexo no espelho revelava a verdade.
"Escondido até dos olhos," murmurou, admirado com a engenhosidade de Elias.
Lucien sabia que estava perto agora, mas isso n?o significava que o perigo havia passado. Na verdade, ele só estava come?ando.
Como ele lidaria com aquilo? A pergunta queimava na mente de Lucien como brasas. Nada fazia sentido. O espelho refletia algo que n?o existia em sua vis?o direta, algo que desafiava a lógica e torcia a realidade. Era injusto, brutalmente injusto. Ele era apenas um garoto de treze anos, jogado em um jogo mortal contra um dos maiores mestres de magia que já caminhara pelo reino. Como poderia vencer alguém que brincava com as leis da percep??o?
Frustra??o fervia em seu peito, mas ele sabia que ceder ao desespero n?o o levaria a lugar nenhum. Era sua primeira vez lidando com magia, e já havia sido lan?ado direto ao chef?o final, como se estivesse em um pesadelo onde todas as probabilidades estavam contra ele.
"O que diabos aquele homem estava pensando quando me mandou aqui?" sussurrou para si mesmo, os dentes rangendo enquanto segurava firmemente o artefato na m?o.
O grito distante de uma besta ferida ecoou lá fora, arrastando-o de volta para a realidade. O tempo estava se esgotando. Cada segundo perdido era um passo mais próximo de sua captura ou morte. Ele olhou para o artefato em sua m?o, sentindo o leve pulsar que parecia vir de dentro dele. Era como se o objeto tivesse vida própria, mas Lucien tinha a sensa??o desconfortável de que sua energia estava se esvaindo.
Duas tentativas, no máximo.
Mas o maior problema n?o era a limita??o do artefato. O verdadeiro problema era ele mesmo. Sua mente girava em círculos, tentando quebrar uma barreira invisível, tentando aplicar lógica em algo que claramente a desafiava. Era como tentar resolver um enigma com pe?as que n?o se encaixavam, e Lucien sabia que, se continuasse nessa linha, estaria condenado.
Ele parou, respirando fundo. Sua mandíbula estava t?o tensa que come?ou a doer, mas ele ignorou.
"Chega de lógica", murmurou, seus olhos gelados e decididos. "Se isso n?o faz sentido, ent?o vou lidar com isso de outra forma."
Sem hesitar, Lucien ergueu o artefato. Mas, ao contrário do que qualquer pessoa sensata esperaria, ele n?o o pressionou contra o espelho, nem contra as paredes do escritório. Ele fez algo insano. Ele pressionou o artefato contra a parte de trás de sua cabe?a, bem na base do cranio.
Seu raciocínio era simples, quase primitivo: se ele n?o podia ver o que estava diante dele, ent?o o problema n?o era o escritório. O problema era ele.
Quando o artefato tocou sua cabe?a e foi ativado, uma onda de energia o atravessou. N?o foi uma dor física, mas algo muito mais profundo. Foi como se algo em sua mente tivesse sido arrancado à for?a, uma barreira invisível que ele nem sabia que estava lá. Por um breve momento, ele sentiu como se estivesse flutuando em um vazio, perdido entre o que era real e o que era ilus?o.
Ent?o, o mundo mudou.
A sala se transformou diante de seus olhos. As paredes que antes pareciam sólidas revelaram símbolos rúnicos brilhando com uma luz etérea. O espelho, que antes refletia algo impossível, agora estava vazio, como se sua fun??o tivesse sido cumprida. E bem no centro do espa?o, onde antes n?o havia nada, estava um baú.
Lucien piscou, incrédulo. Sua respira??o estava pesada, e o suor escorria por suas têmporas. Ele n?o sabia se era pelo esfor?o mental ou pela press?o da situa??o.
“Maldito...” murmurou, horrorizado ao perceber o que havia acontecido. Elias n?o estava ali, mas mesmo assim havia conseguido manipular sua percep??o com um feiti?o de longo alcance. Era um poder que desafiava qualquer senso de seguran?a, uma habilidade que colocava Lucien em completa desvantagem.
Mas o garoto respirou fundo e apertou os punhos. N?o havia tempo para admira??o ou pavor. O baú estava ali, brilhando como uma pe?a de ouro perdida em um mar de sombras. Ele era o objetivo, e Lucien tinha apenas uma chance de alcan?á-lo antes que tudo desmoronasse.
Com passos cautelosos, ele avan?ou, a tens?o no ar quase sufocante. O caos lá fora parecia cada vez mais distante, como se o escritório estivesse isolado do resto do mundo. Mas Lucien sabia
que isso era apenas uma ilus?o temporária. Ele estava correndo contra o tempo, contra o destino. E falhar n?o era uma op??o.